segunda-feira, 9 de abril de 2012

"AMOR" _ Adaptação do Conto de Clarice Lispector

Ainda posso lembrar a fragilidade dos ovos que ao quebrarem escorriam pelo chão do bonde naquela tarde de instabilidade.

A fragilidade daqueles ovos remetiam a fragilidade da minha própria vida.

A desordem da minha juventude não tem espaço pro meu hoje,
tenho filhos de verdade, tenho marido de verdade , tenho um lar de verdade...tenho a solidez...

Solidez que me trouxe a paz que nunca pensei encontrar.

E cotidianamente me doou no cultivo de minha estabilidade doméstica...no meu mundo de aperfeiçoamento continuo...no meu palco previsível de vida.

E me resguardo...me resguardo dos perigos das tardes de inquietação, quando os moveis respiram sem poeira diante da minha inutilidade.

Tudo esta em ordem e tudo devera permanecer em ordem,...até quando o amanhã vier e eu voltar a me dedicar a meus filhos, meu marido e meus moveis
empoeirados...

Ate a hora da inutilidade me inquietar novamente...

E aquela garota livre, com uma felicidade descontrolada,e doida tenta falar comigo, tenta me sufocar...

Foi nessa hora que sem perceber, um cego...um cego partiu a fina membrana da minha vida... mostrando assustadoramente as possibilidades de ser...

...um cego mascando chicle no ponto ...cego...no ponto...mascava chicle...sorria...sorria...

Meu coração se encheu de piedade ...a desordem transbordava ... a desordem de poder ser outra...do mundo precisar de mim....

o mal estar da minha juventude havia voltado...eu não me sentia mais segura...os ovos quebraram...eu não era mais a mesma...uma misericórdia pelo que eu desconhecia invadia meu novo mundo ...

Perdi o ponto de saltar do bonde...me perdi dentro de mim...longe das paredes da minha casa...

Ah...Casa...Cada sua paz?

Algo se quebrou...a vida se apresenta cotidianamente...o mundo é vasto, o mundo é meu...As tardes de inquietação se estendem por todo o dia...nem os moveis me tranquilizam.